terça-feira, 10 de novembro de 2009

Quem escreve um conto, acrescenta ...

A cada ronda a vossa inspiração traz resultados cada vez mais surpreendentes. De história para história é fácil sentir o maior empenho na escolha das personagens, um investimento mais profundo da narrativa e uma imaginação...enfim, sem limites.

Esta ronda até agora foi a mais difícil para escolher a melhor, estão todos de Parabéns.
Mas esta ronda a história vencedora é...


O dia das Fotografias

Foi numa tarde ensolarada que, na aldeia branca do sopé da montanha da neve, se anunciou o dia das fotografias. Na segunda-feira seguinte todos os habitantes tinham que ir até à praça e deixar-se fotografar pelo senhor de bigode farto e chapéu alto, que transportava na algibeira uma pequena caixa: uma máquina fotográfica. Durante essa mesma tarde de sábado todos os habitantes ficaram em agitação.

- Eu vou vestir a minha saia de riscas brilhantes - disse a rechonchuda anã que vivia por baixo do troco do castanheiro que servia de apoio ao cartaz que anunciava o dia das fotografias.

- As riscas da minha saia brilham com a luz do sol, acho que vou ser a mais bonita das fotografias!

Ouvindo isto, o senhor delgado que andava sempre de calções com suspensórios, pois era tão magro que nenhum cinto conseguia segurar os seus calções e tinha por hábito andar sem guarda-chuva mesmo nos dias de chuva torrencial, pois conseguia passar entre as gotas de água sem se molhar, olhou para os pés, dentro das suas galochas prateadas e pensou: - Se a luz do sol faz brilhar as riscas brilhantes também faz brilhar as minhas galochas prateadas e eu não gosto nada destas galochas. Assim vou ficar feio nas fotografias. Acho que na segunda-feira não venho tirar fotografias.

Foi então que entrou pela praça o turbulento tractor do senhor lavrador que fez calar todos os pensamentos de quem por ali estava a pensar em ficar bonito nas fotografias ou a esquivar-se a ser fotografado. Quando o tractor parou e o barulho desapareceu todos imaginavam que podiam continuar a pensar no dia das fotografias, mas sentiu-se de repente um intenso cheiro a bacalhau com broa. Olharam todos para o lavrador que, intimidado, disse:

- Entornei o almoço para cima de mim. Agora tenho a roupa a cheirar a bacalhau.

E baixando o olhar, fixando os olhos no trilho que as rodas do seu tractor tinham deixado no terreiro da praça, continuou - Não se preocupem, não virei tirar fotografias, não quero ficar com uma fotografia a cheirar ao meu almoço.

A anã rechonchuda, até ali apenas preocupada com o brilho das riscas da sua saia disse - oh senhor lavrador, mas as fotografias não têm cheiro. Pode vir tirar a sua fotografia.

E começou a sorrir para o senhor lavrador. Porém, ainda o sorriso não tinha chegado ao máximo do seu encanto e ficou, de repente, com um ar sisudo. As riscas da sua saia tinham deixado de brilhar, porque uma enorme sombra encobriu toda a praça. Foi então que, muito devagarinho, todos olharam para o lado esquerdo da praça. Por trás da torre da igreja espreitou, muito timidamente, um gigante. Foi tão grande o silêncio de toda a aldeia, que o gigante demorou algum tempo a ter coragem para falar. Por fim disse muito baixinho - Será que eu também posso vir tirar fotografias na segunda-feira? Como todos ficaram em silêncio, sem saber o que dizer, o senhor delgado respondeu:

- Talvez o senhor não caiba na fotografia.

E todos acenavam afirmativamente com a cabeça. Mas, antes de poderem continuar a dizer coisas que fizessem o gigante ir-se embora, o senhor do bigode farto e chapéu alto, levantou-se da cadeira do café de onde estava a observar todas estas coisas, tirou da algibeira a sua máquina fotográfica e disse: - Não se preocupe senhor gigante, esta máquina é pequena mas consigo tirar uma fotografia grande, ou uma grande fotografia, como preferir.

O gigante ficou tão contente que deu uma gargalhada tão alta que todos pensaram que estava a fazer trovoada e encolheram a cabeça entre os ombros. Depois disto e como continuavam com a cabeça encolhida e sem grande alegria o fotógrafo disse:

- Não viram que não é trovoada? Porque continuam tristes?

Então a anã continuou - Mas na sombra do gigante as riscas da minha saia não brilham.

- E as minha galochas brilham demais mesmo sem sol - disse baixinho o senhor delgado.

- Ora, ora - disse o fotógrafo em trejeito apaziguador. - Faremos assim. O Gigante fica do lado direito, assim não tapa o sol e as riscas da saia brilham, e ao senhor delgado tiro apenas uma fotografia da cara. Sabem que os artistas conseguem sempre descobrir o lado mais bonito das coisas e todos vocês tem muitas coisas muito bonitas, por isso, venham todos na segunda-feira até à praça que faremos as fotografias mais bonitas de todos os tempos e, num futuro não muito distante virão de todas as aldeias ver as nossas lindas fotografias.

E assim foi, desde esse dia, o dia das fotografias foi sempre dia de festa na aldeia branca do sopé da montanha da neve.

Vítor Nunes

Parabéns ao vencedor, mais um passo para o prémio. Aos restantes "escritores" continuem atentar pois as vossas histórias também estavam fantásticas.


Aguardem as próximas dicas...


2 comentários:

Xana disse...

Parabéns ao Vítor. A história está fantástica. Que imaginação! Está muito bem conseguida, adorei.
Parabéns.

Agora para a Joana deixo uma ideia.
Seria possível dar as dicas e deixar o fim de semana para que possamos escrever as histórias?

Digo isto porque havia mais dois participantes interessados, mas como deviam entregar até 6ª feira não tiveram tempo.
É só uma ideia claro.

Eu por cá fico à espera das próximas dicas.

Bjs

Vitor disse...

Muito obrigado.

Foi uma experiência interessante, escrever a história à medida que a ia contando aos pequenotes que, simutaneamente giravam à minha volta aos pulos e gargalhadas.