sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Quem precisa (mesmo) de chucha?

Os bebés não gostam da chucha. É difícil de acreditar que um bebé nasça a gostar de ter na boca um objecto de borracha, frio e pouco maleável.

No mundo perfeito dos bebés a mama da mãe estaria sempre disponível e os bebés seriam felizes a dobrar: teriam comida ‘a la carte’ e afecto à discrição. Mas, no mundo ideal dos adultos, as mães não podem ser apenas uma mama gigante. Resta aos recém-nascidos contentarem-se com uma imitação.

O reflexo da sucção é algo inato e muitos bebés já chucham no dedo dentro na barriga da mãe. Cá fora, basta tocar-lhes na boca ou na bochecha para que, imediatamente, se transformem em ‘peixinhos dentro de água’, abrindo e fechando a boca em movimentos contínuos. À falta de melhor, os recém-nascidos começam a levar os dedos à boca, uma acção que, de início, pode revelar-se complicada para quem mal controla os movimentos das mãos. Por isso, a maior parte dos bebés aceita de bom grado quando os pais lhe oferecem a chupeta. Finalmente têm algo para satisfazer o seu reflexo instintivo. Os pais respiram de alívio porque, finalmente, vêem o seu filho quieto e calado.

Outros bebés, mais determinados, recusam a chucha enquanto podem. Mas os pais, também obstinados, experimentam todas as formas e feitios até acabarem por convencer os seus filhos de que precisam mesmo da chupeta. Isso mesmo testemunha Elisabete Santos, enfermeira especialista em saúde materna e formadora em aleitamento materno no Hospital Garcia de Orta. «A primeira vez que se dá uma chupeta ao bebé, ele cospe-a imediatamente, porque é algo que não lhe pertence. Mas os pais insistem e acaba por vencer o mais forte.»

HOSPITAIS LIVRES DE CHUCHAS

Na maternidade do Garcia de Orta, tal como em todos os Hospitais Amigos dos Bebés, não entram chuchas. Esta é uma das medidas indicadas pela OMS/UNICEF para que se considere que um hospital tem uma prática de protecção do aleitamento materno. Segundo vários estudos, os bebés que começam a usar chupeta logo à nascença têm tendência para mamar menos. Isto acontece porque a chupeta e a mama exigem modos de sucção diferentes. Assim, se um bebé se habitua a chuchar na chupeta pode atrapalhar-se quando tem a mama na boca e, por isso, não conseguir retirar o leite. Por outro lado, um bebé que está sempre com a chupeta na boca está tão entretido que pede mama menos vezes.

Apesar de no Garcia de Orta não existirem chupetas, muitos pais chegam à maternidade apetrechados com vários modelos. «Se os pais trouxerem uma chupeta, dizemos-lhes os possíveis efeitos da sua introdução precoce. Mas não proibimos. Ensinamos, aconselhamos e orientamos. Os pais, depois, tomam as suas decisões», conta Elisabete Santos, explicando que a maior parte dos pais entende e aceita o conselho dos enfermeiros. Pelo menos enquanto estão na maternidade. Em casa, não haverá pai ou mãe que resista à tentação de oferecer uma chucha ao bebé, na esperança de o sossegar. «A chupeta tranquiliza o bebé e, por isso, serve de tranquilizante para os pais. Numa fase de iniciação é a forma mais fácil de acalmar o bebé. Mas deve ser utilizada como último recurso», afirma. No Garcia de Orta, os enfermeiros ensinam os pais a interpretar os diferentes tipos de choro do bebé – fome, colo, frio ou calor, etc. – e a agir conforme a situação. A chucha, obviamente, não está indicada para resolver nenhum tipo de choro.

«A chupeta deve ser reservada para o vértice da pirâmide», escreve o pediatra Mário Cordeiro in ‘«O Grande Livro do Bebé» (A Esfera dos Livros). «Se um bebé chora porque lhe falta alguma coisa é errado tentar adiar ou colmatar a resolução do problema através da chupeta. Só servirá para fazer do bebé uma pessoa frustrada e derrotista», critica, provocando os pais que insistem no consolo de borracha: «Idealmente as chuchas deveriam ter em conta o interesse e o bem-estar dos bebés e não as conveniências dos pais. Se calhar quem deveria até ter uma chupeta eram os pais!»


CHUCHA OU DEDO, A ETERNA QUESTÃO

Apesar de não ser contra a chupeta, Berry Brazelton, guru da pediatria, prefere a solução «chuchar no dedo», por ser mais prática, tanto para os pais como para o bebé. «Alguns bebés precisam mesmo da chucha para sossegar. São crianças que não conseguem ou não gostam de chuchar no dedo. Mas isso seria preferível, já que o dedo está sempre a jeito! Muitos bebés necessitam de algo que os ajude a relaxar. Quando conseguem esse auto-conforto, tornam-se mais fáceis de criar», escreve n’«O Grande Livro da Criança» (Editorial Presença). Esta alternativa, segundo o pediatra, acaba também por facilitar a vida aos pais, já que não têm de estar sempre com a preocupação de colocar a chupeta na boca do bebé (principalmente durante a noite), uma vez que ele aprende a auto-consolar-se. «O polegar está sempre disponível», sublinha.

Opinião diferente tem Rosa Gouveia, presidente da secção de Pediatria do Desenvolvimento da Sociedade Portuguesa de Pediatria: «Quando os bebés não têm chupeta, chucham no dedo, o que é prejudicial para o desenvolvimento dos seus maxilares, levando a uma má oclusão dentária. Para além disso, é mais fácil usar a chucha só para dormir e, mais tarde, deixar a chucha, do que deixar o dedo».

Num ponto todos os especialistas parecem estar de acordo: bebés constantemente de chupeta na boca, à semelhança da Maggie Simpson, só devem mesmo existir em desenhos-animados. «As chuchas destinam-se aos períodos em que o bebé tem necessidade de chuchar e não para servir como “rolha” para abafar o barulho do choro. Portanto, quando o bebé está bem, calmo e tranquilo, não se deve dar a chupeta ou, se ele a tiver na boca dever-se-á retirá-la. A chupeta deve ser, realmente, o último recurso», afirma Mário Cordeiro.

Para Rosa Gouveia, a chupeta pode ser útil para o bebé «dormir e adquirir autonomia relativamente ao sono e em situações de irritabilidade». No entanto, a pediatra lembra que, «embora tenha vantagem para o bebé, pelo papel calmante de sucção, a chupeta não substitui o papel dos pais».
Mais crítica ainda, Elisabete Santos põe em causa a utilidade de algo que é «contra-natura» para o bebé. «Será mesmo que precisam da chucha?», questiona. E quando os pais lhe fazem a mesma pergunta, a resposta, em jeito de brincadeira, já está estudada: «Se os bebés precisassem mesmo de chucha, já nasciam com ela.» .

A favor:

. Reduz o risco de morte súbita. Vários estudos relacionaram o uso de chupeta para dormir com uma diminuição do risco de morte súbita nos bebés.
. Acalma. A chucha acalma o bebé nas situações em que os pais não podem responder imediatamente.
. Induz o sono. O movimento de sucção ajuda o bebé a adormecer mais rapidamente.

Contra:

. Favorece o aparecimento de otites. Estudos recentes demonstraram que as otites do ouvido médio são mais frequentes nos bebés que usam chupeta continuamente.
. Pode atrasar o desenvolvimento da linguagem. Um bebé que está sempre com a chucha na boca vocaliza e palra menos. A partir dos 12 meses, se a criança continua a ter sempre a chupeta na boca, poderá ter mais dificuldade na aquisição da linguagem.
. Provoca dependência. São bem conhecidos os dramas vividos por pais e crianças na altura de dizer adeus à chupeta.
. Pode provocar deformação dentária. O risco aumenta se o hábito se prolongar para além dos 2 anos.
. Interfere com a amamentação.

Truques para deixar a chupeta:

. Tente que a criança comece a usar a chupeta apenas para adormecer, reduzindo aos poucos a dependência.
. Comece a preparar psicologicamente a criança para o adeus à chucha. Diga-lhe que já está a ficar crescida e que, por isso, já não precisa. Evite frases do género: «Ainda usas chupeta, és mesmo bebé».
. Use a chupeta como moeda de troca para aquele brinquedo que o seu filho lhe anda a pedir.
. Aproveite as épocas festivas. O Natal ou a Páscoa são boas alturas para a criança se separar da chupeta, até porque andam mais entretidas com os preparativos da festa. Sugira-lhe que ofereça a chucha ao Pai Natal ou ao Coelho da Páscoa.
. Quando nasce outro bebé na família, sugira-lhe que dê a chupeta a esse bebé.
. Não deixe que mais ninguém, além dos pais, interfira no processo. Muita gente a dar palpites, só vai servir para a criança se sentir humilhada.
. Como último recurso, há pais que, discretamente, fazem um furo na chucha, deixando-a mole e difícil de chuchar. Quando a criança se queixar, diga-lhe que a chupeta se ‘estragou’.
. Não force. O adeus à chupeta é um processo natural e vai acontecer, mais tarde ou mais cedo.

in Revista Pais e Filhos

9 comentários:

Marta disse...

Sei que o artigo é extenso, mas é mesmo muito interessante. Espero que gostem!!! Beijinhos

Cat disse...

Gostei bastante de ler. Li informações bastante uteis que desconhecia.
Tenho uma sala de 1 ano onde apenas duas crianças (que só estão connosco há duas semanas) é que usam chucha. As restantes nem para dormir usam. Têm sido o meu orgulho, mas olhando para as salas das minhas colegas onde estão crianças mais velhas a usar chucha perguntei-me se teria iniciado todo o processo muito cedo. Agora sinto-me mais confiante.

Mãe João disse...

Alguns sinónimos de extenso: amplo, imenso, profundo, importante, relevante.

GOSTEI!

A Mafalda chuchou no dedo, a Inês chuchou na língua e ao Salvador a mãe (depois de dúvidas, “sentenças”, certezas, advertências, teorias, prós, opiniões, consultas, contras, investigações,…) decidiu dar chupeta.

Para cada um deles o adeus à chupeta foi um processo natural e aconteceu

Chupeta ou não?

NÃO SEI!!!

M. disse...

Nós usamos precisamente o Natal para convencer a M. a "largar" as suas chuchas. Inventámos uma história em que o Pai Natal é um coleccionador e tem um Museu com as Chuchas dos meninos bem comportados, e que se ela deixasse lá as suas o pai Natal não só levava como ainda deixava uma prenda. Desta forma não só foi relativamente fácil ela esquecer a chucha, como nos dias seguintes dizia a toda a gente cheia de orgulho que as "suas" chuchas estavam no Museu do Pai Natal. A história foi-lhe tão marcante, que no ultimo Natal dei por ela a explicar à irmã que quando fosse mais velha tinha de deixar na chaminé as chuchas para elas serem levadas pelo Pai Natal para o Museu. :)

Inês disse...

A eterna questão em torno do uso da chucha. O artigo está bem estruturado e acredito que vá ajudar pais ansiosos. Eu também acho que o deixar a chucha é um processo natural que não deve ser forçado... Já viram alguém entrar de chucha para a faculdade ?;) Leiam vale a pena

Xana disse...

Como mãe de um pequenote, sou muito, mas muito a favor da chucha. Acho que a primeira coisa que comprei para o Simão foram chuchas de vários tamanhos, para ele não ter desculpas. Eu só não queria que ele usasse o dedo. É que eu nunca vi ninguém entrar para a faculdade de chucha, mas já vi alguém entrar para a faculdade a chuchar no dedo. AH POIS É!!!!
O artigo está muito, mas muito bom. Parabéns!

M. disse...

Também concordo com a Xana, prefiro que elas utilizem a chucha ao dedo. Primeiro porque até é mais higiénico (parece-me) e depois porque a chucha ainda se arranja truques para se ir deixando, agora como é que eu as convencia a darem os dedos para o Museu do pai Natal?! ;)

Xana disse...

O artigo é extenso e mostra diferentes pontos de vista o que me parece positivo pois obriga-nos a ver esta questão de diferentes formas.

Na minha opinião se a criança não gosta de chucha não se deve forçar. O Tiago ao nascer também não gostava, mas depois como em quase todas as crianças servia para o acalmar. A chucha é boa para adormecer, mas também tivemos sorte que o Tiago nunca chorou a meio da noite por a ter perdido.

Em relação ao dedo e à chucha também prefiro a chucha.
Tenho uma irmã gémea que usava o dedo enquanto eu usava chucha. Claro que era chuchou muito mais tempo que eu, a minha caiu da janela, até hoje não entendo porque não a foram buscar ;) enquanto que o dedo era difícil de cair pela janela.

Cá em casa o Tiago aceitou pôr a chucha no lixo porque já era grande, com o dedo já não é tão fácil.

Acredito que haja pais que dão chucha em situações que não fazem falta mas daí a dizer que as chuchas deviam ser eliminadas ou que se fizessem falta os bebés nasciam com elas parece-me excessivo.
Afinal os bebés também não nascem com fraldas e não se discute a utilidade delas. LOL

Bjs

Nós disse...

Parabéns Marta!
O Artigo está muito elucidativo.
Agora que o uso da chucha cá por casa já é uma miragem, é-me mais fácil falar sobre isso e dar conselhos.
O Rodrigo usou chucha sim e tinha imensas, embora todas do mesmo "modelo" para quando não soubesse de uma não haver aquele stress de quando se perde a chucha. A chucha é efectivamente um calmante para os nossos filhotes e acho que eles devem usá-la até ao momento que aprendem a tranquilizar-se de outras formas.
A Inês que me perdoe quando diz que ninguém entra para a faculdade com chucha, mas o mal que a chucha faz (tal como diz Rosa Gouveia) demasiado mal à boca dos nossos filhos.
Cá por casa o largar da chucha deu-se de uma forma muito curiosa: a mãe cheia de receios e a querer usar muita pedagogia, o pai muito eficiente chegou perto do filho, teve uma conversa com ele, o filho deu-lhe a chucha e nunca mais quis dormir com ela.
Fiquei sem palavras e acho que é uma demonstração de como não há receitas para largar a chucha.
Bjs